Modernização do agro muda perfil do emprego, acelera mudanças e exige mais qualificação
Entre 2012 e 2023, aproximadamente dois milhões de postos de trabalho foram eliminados no campo
A modernização do agronegócio tem transformado o mercado de trabalho no setor. Embora a adoção de novas tecnologias tenha impulsionado a produtividade, a qualificação da mão de obra e a inclusão de trabalhadores ainda são desafios a serem superados.
Esse cenário foi tema de debate da Rede de Socioeconomia da Agricultura (RSA), iniciativa da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que reuniu especialistas para analisar as mudanças e perspectivas para o emprego rural.
Apesar da relevância do agronegócio na geração de empregos, a ocupação na agropecuária vem caindo ao longo dos anos.
A economista Isabel Mendes de Faria, da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), apresentou um panorama atualizado do setor e destacou que, em 2023, o agronegócio representou 26,8% dos empregos no Brasil, empregando cerca de 28,3 milhões de pessoas.
No entanto, os dados indicam uma migração da força de trabalho rural para segmentos como agroindústria e agrosserviços.
Impacto da mecanização e desafios da formalização
Entre 2012 e 2023, aproximadamente dois milhões de postos de trabalho foram eliminados no campo, reflexo da crescente mecanização e da busca por maior qualificação.
Segundo Isabel, esse movimento reforça a necessidade de capacitação profissional para que os trabalhadores possam se adaptar às novas demandas. "O aumento da produtividade tem sido um fator determinante para a transformação do emprego rural", afirmou.
Outro desafio apontado é a formalização dos trabalhadores. Atualmente, 45% da mão de obra no campo ainda não possui carteira assinada, apesar de uma redução de 2,9% na informalidade entre 2022 e 2023.
No mesmo período, o número de empregados com carteira assinada cresceu 6%. Para Isabel, o entrave principal são os custos da formalização.
"A solução passa pela conscientização e pela progressiva incorporação dos custos ao preço dos produtos na porteira da fazenda", explicou.
Terceirização no agronegócio: flexibilização e desafios
O professor Hélio Zilberstein, da Universidade de São Paulo (USP), analisou o impacto da terceirização no mercado de trabalho agrícola. Ele destacou que a sazonalidade sempre influenciou as contratações no setor, e a reforma trabalhista de 2017 ampliou a legalização desse modelo para atividades-fim.
"Essa flexibilização trouxe benefícios para a organização do setor, mas também desafios para os trabalhadores, que enfrentam um mercado mais dinâmico e menos estável", observou Zilberstein. Para ele, as leis precisam ser atualizadas para acompanhar as transformações do mercado.
Tecnologia exige qualificação
O avanço da tecnologia no campo também foi um ponto central do debate. Segundo o mediador do encontro, Décio Gazzoni, há consenso de que as inovações tecnológicas impulsionam o emprego e elevam a exigência de qualificação.
"A tríade crescimento econômico, educação e desenvolvimento tecnológico é essencial para ampliar a ocupação e melhorar a qualidade do emprego", destacou.
A capacitação profissional foi apontada como um fator decisivo para que a modernização do setor traga ganhos reais para os trabalhadores. Nesse contexto, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) tem um papel fundamental na formação e qualificação da mão de obra rural, sendo um vetor de inovação e gestão.
Gazzoni também ressaltou que, desde 1995, houve um aumento expressivo na produtividade do trabalhador rural, reflexo da incorporação de novas tecnologias e da melhoria na instrução dos colaboradores.
O futuro do emprego no campo
Os especialistas concordaram que a modernização do agronegócio é um caminho sem volta, mas alertaram para a necessidade de estratégias que equilibrem o aumento da produtividade com a inclusão social. Entre os desafios apontados estão:
Qualificação da mão de obra: preparar trabalhadores para lidar com tecnologias avançadas.
Diversificação da economia rural: ampliar oportunidades além da agropecuária, fortalecendo setores como agrosserviços e agroindústria.
Políticas públicas para inclusão produtiva: criar mecanismos que garantam a empregabilidade e reduzam desigualdades sociais.
Papel da agricultura familiar
O pesquisador Vahid Vahdat, do Instituto Veredas e da Universidade Federal do ABC (UFABC), enfatizou que a transição tecnológica no campo não beneficia igualmente todos os segmentos da população.
Ele alertou que a crescente exigência por qualificação pode criar barreiras para trabalhadores rurais de baixa escolaridade.
"É fundamental que políticas públicas sejam direcionadas para a capacitação desses profissionais, garantindo que a modernização do setor ocorra de forma inclusiva", afirmou Vahdat.
Ele também defendeu a diversificação das atividades econômicas no meio rural, alertando que, em algumas regiões, trabalhadores que deixam a agropecuária não encontram alternativas de emprego.
Desafios
O debate promovido pela Rede de Socioeconomia da Agricultura (RSA) deixou claro que o emprego no agronegócio passa por profundas transformações.
A mecanização e as novas tecnologias seguem reduzindo a ocupação na agropecuária tradicional, enquanto setores como agroindústria e agrosserviços absorvem parte dessa mão de obra.
O desafio, segundo os especialistas, é garantir que essa transição ocorra de forma equilibrada, impulsionando a produtividade sem aprofundar desigualdades sociais. A qualificação profissional, a formalização do trabalho e a criação de políticas públicas inclusivas serão determinantes para o futuro do emprego no campo.
Fonte: Agrofy